terça-feira, 25 de outubro de 2011

Palavras e Coisas: As faces secretas das palavras



*Prof. Jadir Pereira
Salve caro leitor!

A partir de hoje contribuirei com uma pequena coluna do blog Leitura e Produção de Texto em Língua Portuguesa, trazendo curiosidades do universo das palavras e das coisas. Afinal de contas já dizia um dos poetas mais nerd e querido da nossa literatura, Carlos Drummond: “Penetra surdamente no reino das palavras […] Chega mais perto e contempla as palavras. Cada uma tem mil faces secretas sob a face neutra”. Sigamos então o mestre, a começar por contemplar uma das faces secretas da palavra palavra.

O termo “palavra” deriva do grego παραβολή (parabolé) formado da junção da preposição para, que significa “ao lado de”, mais a raiz bal-, com o significado fundamental de lançar, atirar, como no verbo gr. ballo (lançar, atirar). Portanto, parabolé tem o sentindo de “jogar ou lançar ao lado de”, e, por extensão, “comparação”, “figura”, “parábola”. Outros derivados desta palavra são os cognatos: it. parola e parlare; fr. parole e parler; esp. palabra e parlar e o pt. palavrear, parlar, parolar. Possuem a raiz bal- os termos diabolos (diabo), com o sentido de caluniador, parabolé (parábola), comparação; symbolon (símbolo), sinal de reconhecimento.

O termo em latim clássico que designava palavra é uerbum, oriundo do indo-europeu werdh-. Esta raiz sobrevive no inglês word (palavra); no alemão Wort (palavra); no letão vārds (palavra). No português o termo verbo designa palavra com o sentido mais frequente de uma ação. A Vulgata (João I, 1) traz a seguinte tradução da Septuaginta: “In principio erat Verbum et Verbum erat apud Deum et Deus erat Verbum (No princípio era a Palavra, e a Palavra estava junto de Deus, e a Palavra era Deus). A criação do universo resulta da palavra de Deus tal como descreve o livro de Gênesis 1:3: dixitque Deus fiat lux et facta est lux" (Deus disse: Faça-se a luz! E a luz foi feita). Portanto, a cosmogonia judaico-cristã aceita a palavra, isto é, o som, como elemento imprescindível para a gênese do universo. Na Mitologia Hindu, o deus Shiva (re)cria o universo a partir do damaru, um tambor em forma de ampulheta que representa o som da criação do universo. Através das batidas do tambor, Shiva controla o ritmo do universo e o compasso da sua dança. Reza a lenda que, quando Shiva deixa de produzir o som, o universo se desfaz.  Nas antigas epopeias gregas, a palavra é considerada sagrada, divina, por isso, para que o poeta construa seus versos memoráveis, é necessário evocar o poder das musas.

Como se pôde ver, há muitos mistérios que rondam as palavras. Que tal utilizar o poder das palavras e produzir o seu próprio universo, isto é, o seu próprio texto? Eu acabo de construir o meu.

*Professor de Latim e Mitologia da Universidade Federal de Alagoas

2 comentários: